O presidente da APAS João Galassi concedeu entrevista à equipe da Associação Paulista de Jornais (APJ) na semana passada, na sede da APAS, em São Paulo, onde falou sobre o tema da APAS 2013 – 29º Congresso e Feira de Negócios em Supermercados: Capitalismo Consciente. A reportagem foi publicada em vários jornais do interior paulista, como “O Vale” e “Diário da Região”.
Leia abaixo a íntegra da entrevista:
Quando uma empresa tem um propósito que transcende os resultados de lucro, os consumidores notam isso e desenvolvem o sentimento de admiração por ela.
Essa é uma das premissas que levaram a Apas (Associação Paulista de Supermercados) a adotar o tema “Capitalismo consciente” como o mote principal para discussão do congresso e feira de negócios que a entidade promoverá entre os dias 6 e 9 de maio, no Expo Center Norte, em São Paulo.
Capitalismo consciente é um conceito amplo, do qual fazem parte a sustentabilidade e a confiança nas relações. O guru do novo pensamento é o consultor indiano Raj Sisodia, convidado a discorrer sobre o tema, ao lado do empresário Abilio Diniz, presidente do Conselho do Pão de Açúcar.
Sisodia defende que os empresários devem pensar menos na rentabilidade do negócio e mais em encontrar um sentido amplo para as suas empresas.
“Toda empresa que é admirada tem um propósito forte”, diz o empresário João Galassi, presidente da entidade que reúne 1.200 associados, ou 2.700 lojas, em todo o Estado, responsáveis por um faturamento da ordem de R$ 75 bilhões em 2012.
Na última semana, entre reuniões preparatórias do evento, Galassi recebeu a APJ (Associação Paulista de Jornais), da qual O VALE faz parte, na sede da Apas, à rua Pio 11, no Alto da Lapa, em São Paulo.
Entrevista:
Em que contexto surgiu o tema do capitalismo consciente no meio supermercadista?
Aproveitamos o momento de negócios, intercâmbios e treinamentos da feira para trazer uma reflexão. Uma discussão sobre tendências. Acreditamos na força deste tema.
Em 2009, discutimos sustentabilidade e olhe o que está acontecendo hoje. Discutimos as lojas verdes e uma série de ações que entendíamos que seriam balizadores dos negócios no futuro. Em 2010, discutimos a diversidade. Em 2011, inovação e em 2012, colaboração.
A evolução natural desses temas seria discutir o capitalismo como um todo e não mais em frações. Colocar tudo no mesmo guarda-chuva. Há um grupo de empresas discutindo esse assunto nos Estados Unidos e mostrando a visão da gestão com quatro pilares.
Primeiro, ter um propósito, montar o negócio além do lucro; segundo, uma cultura consciente onde todos estão incluídos dentro dos mesmos valores de transparência e confiança; terceiro, uma liderança compartilhada, num processo holístico com visão de servir, ser um servidor no processo de desenvolvimento; e o quarto pilar, a noção de que fazemos parte de um todo.
Poderia dar um exemplo prático?
Nossa loja não é um supermercado que simplesmente vende alimentos, não. Temos uma empresa, que está dentro de uma comunidade, que atua com uma série de fornecedores e consumidores, com o governo, que está inserida na sociedade.
Um exemplo é a vacinação, o supermercado está lá fazendo esse papel divulgador e operador, muitas lojas participam ativamente com espaço para a campanha e a vacinação. A empresa faz parte de um conjunto, por isso a cultura do capitalismo consciente traz como valor os stakeholders, as partes.
Dentro desse conjunto, um valor importante é a confiança. Fomos ouvir os consumidores, numa pesquisa da Nielsen. Você confia no varejo? O que faz você aumentar a confiança quando determinado supermercado pratica determinadas coisas? As respostas vamos apresentar e discutir na feira.
O que tira a confiança? Há uma série de respostas. Com base nesse resultado, vamos levar para os supermercadistas propostas para a cultura consciente.
Hoje eu estava discutindo um assunto e estávamos em dúvida. Então veio um propósito naquele trabalho e aí fez sentido. Eu sei agora que vamos fazer aquilo, mas com um propósito maior. As empresas e as pessoas se sentem melhor trabalhando em cima de um propósito.
Quando começa a surgir o propósito, os consumidores notam isso e têm o sentimento de admiração pela empresa. Toda empresa que é admirada tem um propósito forte.
E qual é o propósito maior de um supermercado?
Cada um tem que construir o seu. Porque isso está envolvido na cultura, na crença e vivência do empresário. Conheço empresas que têm o propósito de gerar um lucro para usar para melhorar as condições de saúde da população.
A rede Whole Foods, nos EUA, têm o propósito de levar alimentação saudável para população. Conheci um hotel, em Campos do Jordão, Botanique, o propósito é levar o que o Brasil tem de melhor, então, a carta de vinhos é brasileira, uma quebra de paradigmas.
O Bill Gates usa o rendimento da empresa para diminuir a mortalidade infantil e o índice de pessoas que se contaminam com o HIV.
A questão é ter um propósito. Porque daí você tem uma razão para levantar cedo, para trabalhar. E nesse propósito todos acreditam e vivenciam.
O propósito como fator motivador na empresa?
Exatamente, empreendedorismo. A Apas olha à frente. Não olhamos a curto prazo. Discutir o capitalismo consciente em maio, e em junho ter que implantar, não é isso. Começa um processo de transformação e quando esse movimento chegar, o setor já incorporou.
A Apas enxerga então o capitalismo consciente como uma tendência?
Sim. A sustentabilidade não é modismo mais. O negócio para se sustentar tem que ter uma série de ações que envolvam a sociedade. É uma realidade. Mas esse é um pedaço do processo que terá que estar dentro do pacote. Você tem uma boa base de construção se continuar avançando na sustentabilidade, mas temos algo maior pela frente que é o capitalismo que olha o todo, holístico, com liderança diferenciada.
Posso fazer a sustentabilidade olhando o meu negócio só, não envolver fornecedores e a sociedade e ter um prédio verde, só o prédio. Mas aí não estarei olhando o todo.
O senhor acredita que o tema vai pegar?
Olhe, em 2009 quando falamos em sustentabilidade, parecia tão distante, e pegou. A entidade tem um papel de vanguarda. A feira para nós não é um negócio, é um meio que a gente se utiliza para levar e estender um benefício aos supermercadistas e à cadeia.
Como ficou a questão das sacolas plásticas nos supermercados?
Tivemos uma experiê
;ncia muito interessante no Estado de São Paulo, onde o programa da Apas num primeiro momento não pode ser implantado. Aconteceram decisões da Justiça. E agora estamos numa fase muito rica, promovida pelo Ministério do Meio Ambiente, onde todas as partes envolvidas estão à mesa — a indústria do plástico, os consumidores, o governo federal, o varejo, as associações, o meio acadêmico — acho que vamos chegar a um consenso de uma política que possa trazer o benefício e o conforto ao consumidor, ao mesmo tempo garantindo que o nosso bairro, a nossa comunidade, nossa cidade, tenham meio ambiente mais saudável.
Não estou olhando o planeta, mas a rua, o dia a dia, a sacola voando e entupindo um bueiro. É o olho no bairro, não preciso olhar macro para ver o problema. Acho que vamos ter um bom encaminhamento.
Qual será o próximo passo nessa questão?
Esse grupo de trabalho tem seis meses para se chegar a uma resolução. Já fizemos três reuniões e na quarta começaremos a discutir propostas concretas. Estou animado. Não estamos mais na guerra de informações. Sofremos muito naquele período.
E os hábitos dos consumidores, de que forma interferem no planejamento dos supermercados?
No passado, tentávamos ser tudo — mais barato, amplo, oferecer variedade e estar próximo. Há cinco pontos para as empresas se posicionarem. O reconhecimento por preço; por variedade; por serviços; por oferecer bom ambiente de compras; ou pela proximidade. Há quem consiga dois dos itens. Nós queríamos ser tudo isso. Mas o consumidor está entendendo o papel de cada um. Não vou ao McDonald’s buscar uma pizza. Os supermercados estão começando a ter a formatação clara vez mais clara. Cada empresário está entendendo qual é o seu papel e cada um está fortalecendo o foco, sem dor, num desses pontos. Sem o sentimento de que está deixando de fazer algo. É a cara e o jeito do negócio. As empresas globais acabam colaborando muito para isso. Conforme vai se especializando, você faz melhor, avança.
As primeiras pesquisas diziam que o consumidor não era fiel, porque ia a três estabelecimentos. O que não tinham captado naquele momento e agora está começando a ficar claro é que o varejo começou a se moldar em modelos que atendem determinadas famílias de um determinado formato, mas estas precisam dos três modelos, e são fieis aos três players.
Como está a questão da qualificação da mão de obra?
Estamos ainda numa fase difícil, tom rotatividade altíssima, demanda para contratação alta e não temos oferta à altura. É o setor que tem de fazer todo o investimento de formação. Agora, o Via Rápida, do governo do Estado, forma em três meses açougueiro, padeiro e o caixa, está melhorando.
