Nesta quinta-feira, 10, foi publicado no Diário Oficial do Estado o veto de Geraldo Alckmin ao Projeto de Lei nº 986/2015, que obrigava todos os estabelecimentos de varejo a informar aos consumidores o histórico de preços dos últimos seis meses dos produtos ou serviços em promoção ou liquidação. Em dezembro do ano passado, a APAS protocolou ofício ao governador pedindo tal veto.
Nas razões do veto, o governador Geraldo Alckmin argumenta que “o modelo de organização econômica adotado pelo ordenamento constitucional consagra, entre outros, o princípio da livre iniciativa, o que pressupõe a liberdade de atuação e de gestão das empresas exploradoras da atividade econômica, inclusive no que concerne ao funcionamento e organização detalhada do serviço ao estabelecimento dos preços dos bens e serviços produzidos”.
Ainda de acordo com Alckmin “tal cenário não recomenda a imposição de regramento específico que interfira na operação comercial, sob a justificativa de defender o consumidor contra eventuais abusos, que já estão devidamente resguardados pelo Código de Defesa do Consumidor – Lei federal nº 8.078, de 11 de setembro de 1990”.
O veto agora será analisado pela Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo.
Confira, na íntegra, o texto do governador Geraldo Alckmin na defesa ao veto:
A Sua Excelência o Senhor Deputado Fernando Capez, Presidente da Assembleia Legislativa do Estado.
VETO TOTAL AO PROJETO DE LEI Nº 986, DE 2015
Mensagem A-nº 35/2016, do Senhor Governador do Estado São Paulo, 09 de março de 2016
Senhor Presidente
Tenho a honra de transmitir a Vossa Excelência, nos termos do artigo 28, § 1º, combinado com o artigo 47, inciso IV, da Constituição do Estado, as razões de veto total ao Projeto de lei nº 986, de 2015, aprovado por essa nobre Assembleia, conforme Autógrafo nº 31.480.
De origem parlamentar, a proposta obriga todo fornecedor de produto ou serviço em estabelecimento de varejo físico ou “online” a informar ao consumidor o histórico dos preços do produto ou serviço veiculado como promoção ou liquidação, na forma que especifica. Reconheço a preocupação do Legislador na elaboração de normas que visem à defesa e tutela do consumidor, como bem realçado na justificativa que acompanha a proposta.
Todavia, vejo-me compelido a negar sanção ao projeto, pelos motivos que passo a expor.
O modelo de organização econômica adotado pelo ordenamento constitucional consagra, entre outros, o princípio da livre iniciativa, o que pressupõe a liberdade de atuação e de gestão das empresas exploradoras da atividade econômica, inclusive no que concerne ao funcionamento e organização detalhada do serviço ao estabelecimento dos preços dos bens e serviços produzidos.
Importa reconhecer, nesse contexto, que a ordem constitucional protege, igualmente, a livre iniciativa e a defesa do consumidor, de forma que a atuação das empresas de um determinado mercado deverá respeitar a defesa garantida aos consumidores, ao mesmo tempo em que tal defesa não poderá constituir um empecilho àquela liberdade.
Não se quer afirmar que a liberdade de iniciativa é absoluta. Assim não é, na medida em que a própria Constituição prevê a ação estatal normativa e reguladora da vida econômico-privada, no interesse do desenvolvimento nacional e da justiça social. Mas configura-se atuação permitida em caráter excepcional, se necessária para realizar o objetivo primordial da ordem econômica, que consiste, por expressa definição constitucional, em assegurar a todos existência digna, conforme os ditames de justiça social.
Tal cenário não recomenda a imposição de regramento específico que interfira na operação comercial, sob a justificativa de defender o consumidor contra eventuais abusos, que já estão devidamente resguardados pelo Código de Defesa do Consumidor – Lei federal nº 8.078, de 11 de setembro de 1990.
A proposta, em decorrência, afronta o artigo 170 da Constituição Federal, que estampa os preceitos que regem a ordem econômica e financeira do País. Ressalto que a Secretaria da Justiça e da Defesa da Cidadania manifestou-se de forma contrária à iniciativa.
Apontou o órgão que a intervenção legislativa, nas formas e condições de venda dos produtos ou serviços com redução de preços, além de configurar interferência incisiva no planejamento e organização das empresas, tem potencial para desestimular a prática de oferecer promoções e liquidações de mercadorias por parte dos fornecedores, o que não atenderia ao interesse do consumidor.
Cumpre, ainda, observar que a fixação de multa e penalidade, constante da proposição, a serem aplicadas em caso de descumprimento da lei, está em desacordo com as normas fixadas no Código de Defesa do Consumidor (artigos 56 e 57). Importante esclarecer, ainda, que a proposta, ao estabelecer, no caso de reincidência, a cassação da eficácia da inscrição no cadastro de contribuintes do Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e sobre a Prestação de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação – ICMS, deixa de observar que o descumprimento da lei não guarda relação com qualquer lesão à legislação tributária.
Neste aspecto, a Secretaria da Fazenda ponderou que a inscrição no cadastro de contribuintes do ICMS é mecanismo de controle do Fisco e a penalidade em exame configura sanção de natureza administrativa fiscal. A medida só deve ser utilizada, pois, em casos excepcionais, sob o risco de banalizar instrumento fundamental de controle do Estado na relação Fisco-contribuinte.
Por fim, a determinação para que o Poder Executivo implemente campanha educativa nos meios de comunicação para esclarecimento dos deveres e sanções impostos pela lei interfere na gestão administrativa, invadindo campo de atuação próprio da Administração, não se harmonizando com o princípio da separação dos Poderes (artigo 2º, Constituição Federal; artigos 5º e 47, incisos II e XIV, Constituição Estadual).
Fundamentado, nesses termos, o veto total que oponho ao Projeto de lei nº 986, de 2015, restituo a matéria ao reexame dessa ilustre Casa Legislativa.
Reitero a Vossa Excelência os protestos de minha alta consideração.
Geraldo Alckmin GOVERNADOR DO ESTADO