Assembleia Legislativa de SP tem sido usada para criar um ambiente político negativo em Brasília, onde caminham Projetos de Leis que permitem a comercialização dos MIPS em outros estabelecimentos.
O setor supermercadista foi representado pelo Executivo de Relações Institucionais da APAS, Rodrigo marinheiro, e pelo Vice-Presidente da ABRAS, Dr. Mauricio Ungari, em audiência pública realizada nesta quinta-feira (2/12) no Auditório Teotônio Vilela (ALESP). Na ocasião, os representantes do essencial setor supermercadista debateram com representantes das farmácias o Projeto de Lei 451/2021, de autoria do deputado estadual Marcio da Farmácia (PODEMOS), que versa sobre a comercialização dos Medicamentos Isentos de Prescrição (MIPs). A propositura legislativa 451/2021, apesar de repetir a legislação federal vigente e ser inconstitucional, porque não compete ao Estado legislar sobre a matéria, tramitava em regime de urgência na ALESP até que a deputada Carla Morando (PSDB) apresentou um substitutivo, fazendo com que o Projeto, que de urgente não tinha nada, voltasse para uma melhor análise das comissões.
A Associação Paulista de Supermercados (APAS) defende que a matéria precisa ser debatida na esfera federal e que o Projeto de Lei 451/2021, do deputado Marcio da Farmácia, além de não trazer nenhuma inovação à ordem jurídica, pois não muda em nada na legislação vigente no Estado (que é federal), desrespeita a Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo ao utilizá-la como pano de fundo para criar um ambiente político desfavorável para o debate existente em Brasília sobre a comercialização dos MIPs em outros estabelecimentos, acabando com a reserva de mercado existente hoje às farmácias. Legislar sobre a dispersão de medicamentos na ALESP também é inócuo em razão da inconstitucionalidade flagrante, pois a competência para legislar sobre medicamentos é exclusiva da União.
O setor farmacêutico tem mobilizado parlamentares próximos com o intuito de que novas Leis aprovadas nas esferas estaduais emperrem a tramitação de Projetos de Lei e, segundo reportagem do site JOTA (leia aqui), até mesmo uma Medida Provisória (MP) que libera a venda de medicamentos isentos de prescrição médica nos supermercados. Segundo a reportagem, essa MP teria sido articulada pelo Ministério da Economia junto à Secretaria de Governo da Presidência da República ainda no primeiro semestre deste ano, em sua minuta autoriza a comercialização de medicamentos isentos de prescrição, os chamados MIPs, em supermercados e em lojas de conveniência, e prevê um prazo de regulamentação pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). A minuta da MP estaria na Secretaria de Ciência, Tecnologia, Inovação e Insumos Estratégicos (SCTIE), do Ministério da Saúde, e na sequencia seria encaminhada à Casa Civil da Presidência da República.
Na avaliação dos propositores, a medida tem potencial para aliviar gastos do Sistema Único de Saúde (SUS) a partir da ampliação da oferta desses remédios a preços ainda mais baixos pela iniciativa privada, dentro de uma política de promoção do autocuidado.
A estratégia do setor farmacêutico para criar um ambiente político desfavorável à tramitação da MP tem sido através Projetos de Leis por meio de parlamentares próximos do setor, como o Deputado Estadual Márcio da Farmácia. As Assembleias Legislativas do Rio de Janeiro (PLs 1629/2019 e 4441/2018) e do Espírito Santo (614/2021) possuem Projetos de Leis similares ao PL 451/2021 proposto na Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo.
Quais os benefícios da MP que está sendo editada em Brasília?
O acesso aos medicamentos isentos de prescrição seria mais democrático, fazendo com que a população que não tem acesso às farmácias tivesse à disposição medicamentos que combatem males menores. Dados da Associação Brasileira dos Supermercados (ABRAS) apontam que 20% dos municípios não contam com esse tipo de estabelecimento. A comercialização de MIPs em supermercados pode atender regiões onde as farmácias não chegam. Somente no Estado de São Paulo seriam mais 22 mil pontos de venda para os medicamentos isentos de prescrição, facilitando o acesso por parte da população.
A comercialização dos MIPs fora das farmácias pode resultar na queda dos preços desses medicamentos, uma vez que a quebra do monopólio e a livre concorrência contribuirão para a redução dos valores. Nos anos 1990, houve uma redução de 35% nos preços dos medicamentos (segundo dados da ACNielsen), quando foi permitido que os supermercados comercializassem os MIPs.
Os gastos das famílias brasileiras com saúde estão em 4º lugar nas despesas domésticas. Os medicamentos representam 48% do total das contas; e 52% dos brasileiros abandonam tratamento médico por falta de recursos.
Estudo publicado pela Associação da Indústria Latino-Americana de Autocuidado Responsável (ILAR) mostra que o uso de MIPs pela população gera uma economia ao Sistema Único de Saúde. Para cada R$ 1 gasto com MIP, são economizados R$ 7 com o sistema de saúde público. Dentre os motivos estão que os MIPs promovem a prevenção de doenças, seu uso dispensa visitas a unidades de saúde para tratar sintomas menores, entre outros fatores.
Livre concorrência no exterior, reserva de mercado no Brasil
No exterior, a comercialização de MIPs já é liberada em supermercados de países da Europa, Ásia e também nos Estados Unidos. Eis alguns deles: Canadá, Inglaterra, Portugal, Itália, Dinamarca, Noruega, Suécia, Alemanha, Holanda, Hungria, Suécia, Austrália, Japão, Israel, México, Venezuela, Colômbia, China, Rússia e Índia.
O que são os MIPs?
Os medicamentos isentos de prescrição, conhecidos como MIPs, são listados pela Anvisa em instrução normativa e possuem baixo potencial de risco ao paciente, nos termos da RDC 98/2016. De acordo com a versão de 2021 do Anuário Estatístico do Mercado Farmacêutico elaborado pela Secretaria-Executiva da Câmara de Regulação do Mercado de Medicamento, em termos de faturamento, os MIPs representavam 9,65% do mercado em 2019, com valor superior a R$ 8,2 bilhões. Medicamentos prescritos tiveram faturamento de R$ 77,6 bilhões.
Os MIPs não necessitam de receita médica, não possuem tarja e têm baixo potencial de intoxicação. Eles são usados para tratar sintomas ou males menores, como indigestão, azia, tosse, congestão nasal, assadura etc. Como exemplo estão Dorflex, Novalgina, Neosaldina, Sal de Fruta, Buscopan, Vick-Vaporub, Allegra, Lisador, Systane, Tylenol, entre outros. São medicamentos liberados nas gôndolas das farmácias, que não ficam armazenados atrás do balcão.
A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) lista atualmente 257 fármacos como MIPs e 51 tipos fitoterápicos. Segundo a Organização Mundial da Saúde, o uso de medicamentos que não necessitam de receita médica é parte importante do autocuidado.
Para ser considerado MIP, o medicamento passa por uma avaliação criteriosa da Anvisa, que analisa requisitos como baixo teor de toxicidade, reações adversas reversíveis e baixo risco em relação à superdosagem.
Dados do Sinitox (Sistema Nacional de Informações Tóxico-Farmacológicas) mostram que os principais medicamentos causadores de intoxicações no país não são MIPs, mas sim antidepressivos, anticonvulsivos, anticoncepcionais, neurolépticos e ansiolíticos (todos com tarja).