Foi publicado no Diário Oficial desta quinta-feira, 09 de fevereiro, o veto total do governador Geraldo Alckmin ao Projeto de Lei Estadual nº 784/2014, que garantiria o atendimento prioritário e a acessibilidade de pessoas com obesidade em grau III, aos serviços dos estabelecimentos bancários, comerciais, órgãos públicos e outros que importem em atendimento por filas, senhas ou outros métodos similares.
Em dezembro de 2016, a APAS protocolou ofício ao governador Geraldo Alckmin e, entre os argumentos para o veto, a Associação destacou que “pela ampla abrangência da referida propositura, é possível afirmar que diversos estabelecimentos, seja pela disposição física do imóvel em que estão localizados, seja pela própria característica operacional do empreendimento não têm capacidade de dispor do assento descrito, nestes casos, o Projeto deixa dúvidas e margens de interpretação sobre a solução a ser adotada”.
Outro argumento refere-se ao Índice de Massa Corporal de uma pessoa, que, na explanação da APAS, “só pode ser medido com acurácia através de exames laboratoriais complexos e onerosos e, dessa forma, um leigo não conseguiria identificar quais, efetivamente, são as pessoas que detêm o direito à prioridade que a norma pretende alcançar. Essas pessoas necessitariam mostrar laudos ou documentos oficiais para demonstrar seu direito. Entendemos, mais uma vez, que a complexidade de operacionalização efetiva da proposta a torna inviável”.
Confira, abaixo, as razões apresentadas pelo governador Geraldo Alckmin ao veto total do PL.
VETO TOTAL AO PROJETO DE LEI Nº 784, DE 2014
São Paulo, 08 de fevereiro de 2017
Mensagem A-nº 28/2017
Senhor Presidente
Tenho a honra de levar ao conhecimento de Vossa Excelência, para os devidos fins, nos termos do artigo 28, § 1º, combinado com o artigo 47, inciso IV, da Constituição do Estado, as razões de veto total ao Projeto de lei nº 784, de 2014, aprovado por essa nobre Assembleia, conforme Autógrafo nº 31.794.
A proposição garante o atendimento prioritário e a acessibilidade de pessoas com obesidade em grau III, aos serviços dos estabelecimentos bancários, comerciais, órgãos públicos e outros que importem em atendimento por filas, senhas ou outros métodos similares. Considera pessoa com obesidade em grau III aquela que possui o Índice de Massa Corporal – IMC acima de 40 kg/m², determinando a criação de senhas prioritárias de atendimento especial que evitem, ao máximo, seu deslocamento e a permanência em pé.
Estabelece, ainda, que será destinado, no mínimo, um assento, com dimensão, resistência e conforto compatíveis com o correspondente grau de obesidade, em área identificada visualmente como sendo exclusiva para as pessoas com as características mencionadas no projeto de lei.
Determina, adicionalmente, que seja disponibilizado acesso especial para as pessoas com obesidade em grau III em todas as áreas de acesso dos prédios, públicos ou privados, que sejam controlados por roletas ou catracas.
Sem embargo dos altivos propósitos que motivaram a iniciativa, vejo-me compelido a negar sanção ao projeto, pelas razões que passo a expor. A teor do disposto no artigo 23, inciso II, da Constituição Federal, o cuidado com a saúde e assistência pública, assim como a proteção e garantia das pessoas portadoras de deficiência competem a todos os entes da Federação e, nesse mesmo diapasão, estabelece a Carta Federal, no artigo 24, incisos XII e XIV, a competência concorrente da União, dos Estados e do Distrito Federal para legislar sobre a matéria.
As disposições contidas na proposição, conquanto não tratem de pessoas portadoras de deficiência, estabelecem medidas voltadas àquelas que, em razão de condição específica, possuem mobilidade reduzida, justificando tratamento diferenciado para proteção à saúde e integração social.
Trata-se, pois, de tema sobre o qual o Estado pode dispor, no exercício da competência concorrente, porém não pode fazê-lo livremente, em razão das limitações contidas nos §§ 1º e 2º do citado artigo 24 da Constituição Federal.
No que respeita à competência concorrente, a Carta da República instituiu situação de condomínio legislativo entre União, Estados e Distrito Federal, donde resulta inequívoca repartição vertical de competências normativas: ao Poder Central cabe estabelecer normas gerais e aos demais pertence a competência suplementar.
Exercer a competência concorrente deferida aos Estados significa pormenorizar as normas gerais da União e estabelecer condições para sua aplicação, editando regras que não criem direito novo, ampliem, restrinjam ou modifiquem direitos e obrigações fixados pelo Poder Central, ou contenham particularidades incompatíveis com a norma geral.
Conforme preceitua o §3º do artigo 24 da Constituição da República, apenas quando inexistir lei federal fixando normas gerais, os Estados exercerão a competência legislativa plena, para atender a suas peculiaridades.
Outrossim, estabelece o §4º do mesmo dispositivo constitucional, que a superveniência de lei federal sobre normas gerais suspende a eficácia da lei estadual, no que lhe for contrário. Nesse contexto, importante salientar que, após a apresentação do projeto de lei em exame, sobreveio a Lei federal nº 13.146, de 6 de julho de 2015, denominada Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência, aplicável também às pessoas com mobilidade reduzida, entre elas os obesos (artigo 3º, inciso IX).
Referido diploma legal alterou o artigo 1º da Lei federal nº 10.048, de 8 de novembro de 2000, que trata especificamente do atendimento prioritário às pessoas portadoras de deficiência e com mobilidade reduzida, passando a incluir expressamente os obesos no rol dos que contam com tal direito assegurado.
Alterou, igualmente, a Lei nº10.098, de 19 de dezembro de 2000, que estabelece normas gerais e critérios básicos para a promoção da acessibilidade das pessoas portadoras de deficiência ou com mobilidade reduzida, incluindo as pessoas obesas (artigo 2º, inciso IV).
Ao regulamentar as Leis nº 10.048 e 10.098, de 2000, o Decreto nº 5.296, de 2 de dezembro de 2005, estabeleceu a forma como se dará o atendimento prioritário e as condições gerais de acessibilidade das pessoas com deficiência e com mobilidade reduzida, aplicando-se, por força das alterações supracitadas, também aos obesos.
Diante desse arcabouço jurídico, conclui-se que as normas gerais editadas pela União esgotaram a matéria, resguardando os direitos das pessoas obesas de forma mais ampla do que a pretendida com a presente propositura, pois não se limitaram às pessoas com obesidade em grau III.
Fundamentado nestes termos o veto total que oponho ao Projeto de lei nº 784, de 2014, devolvo o assunto ao reexame dessa ilustre Assembleia.
Reitero a Vossa Excelência os protestos de minha alta consideração.
Geraldo Alckmin
GOVERNADOR DO ESTADO